quarta-feira, 24 de agosto de 2011

28

Quando um dia eu for luz e eternidade talvez perceberei que todo o tempo é uma coisa só, não como um Rio de Heráclito e sim uma lagoa. O tempo quem sabe é um grande holograma, uma aurora boreal, uma asa de beija-flor.



Nasci em um dia 28. Este ano completo 28. 28 é um número que não tem apelido entre os cantadores de bingo. 28 é um número qualquer, simplesmente existe porque tinha de haver alguma coisa antes do 29. Os números mais importantes foram escolhendo para si funções maiores, o cem completa um ciclo numérico importante e está na porcentagem, nos centésimos e nos séculos. O 33 teve o privilégio sacrossanto de ser a idade de Cristo quando morreu,  e nesse campo religioso temos o 3 da trindade, o 12 dos apóstolos, o 7 dos pecados ou dos dias da semana e tantos outros. No campo profano podemos pintar o 7 conforme o ensejo e o desejo.
Fui pesquisar, devia ser ignorância minha achar que o 28 fosse assim coisa tão banal, e descobri que o dia 28 de Agosto é o dia do avicultor e do bancário. Os bancários aliás devem ter uns três ou quadro dias para eles todo ano, fruto certamente de um lindo histórico de lutas e reivindicações da categoria. Para não ser tão negativo com a data de meu natalício, devo informar que Goethe nasceu neste mesmo dia. O que além de enobrecer muito o dia mostra que a mediocridade da data não significa necessariamente a do ser a ela ligado. Honra-me muito saber que tenho pelo menos isso em comum com Goethe.
Mas no fundo acho que há uma grande mensagem no número 28. A alguém sempre caberá a função de ser o intervalo entre os grandes números, o intervalo de intervalo, o elo que nada mais quer além do que ser corrente. E se pudéssemos olhar por um instante para nossas vidas como se fossem um imenso rolo de filme, veríamos que ela se faz muito mais de dias 28, 27, 26 do que de grandes acontecimentos.
O que milagrosamente acontecerá comigo quando o relógio chegar ao 12 no dia 27? "Como é fazer 28" diz sempre alguém, me deixando calado e sozinho com tamanho enigma. Quanto tempo ainda falta para que eu possa dizer que estou mais velho? E se em um rompante eu deixasse tudo para traz, mudasse de nome e cidade e tudo isso em uma única hora? E se eu simplesmente me metesse entre cobertas e fingisse durmir até que venha a segunda-feira? Quanto tempo ainda resta até que eu tenha 28?

M.U.C.C.

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