Sonhei. Da mais dedicada e devota maneira. Sonhava convincentemente, como sempre. Durante aquele compasso de tempo eu seria capaz de chamar aquele universo de realidade, eu existia ali durante o sonho. Só agora passado o porre de morfeu, percebo que a música que ouvia não era a única manifestação apta a ser classificada como música. Sim, havia, com quase certeza, uma música que tocava em quanto eu existia em sonho. Era o que se chama normalmente de sertanejo universitário, confesso.
Só pode ser isso. Lembro das frases emitidas por uma "sanfona" renitente, lembro-me da bateria tresloucada que sonhava, ela também, ser bateria de rock'n roll. Esqueço-me da letra, ...com certeza era sertanejo universitário. O que mais me apavora é que o complexo sonoro que nomino como sertanejo de caráter universitário, e as universidades brasileiras merecem a referência, era proveniente não da minha mente, mas deste mundo aqui, de fora do sonho. Algum vizinho devia estar a degustar auditivamente esse "quitute" musical.
Mas em minha perspectiva momentânea, aquela era uma música que eu deveria aceitar, deveria absorver seu pulso e argumento. Os sonhos são autoritários. Nos sonhos não podemos escolher para onde vamos, do que gostamos, do que amamos ou desejamos ardentemente. O sonho, venha de onde vier, não confia em nossa consciência. Em sonhos gosta-se, ama-se, deseja-se sem a menor possibilidade de crítica. Quero crer que neste mundo fora-do-sonho as coisas sejam diferentes, quero crer que sou, mesmo que debilmente, o senhor de mim, que define o bom e o ruim, o aceitável e o evitável. Que estratégia neural repugnante essa de meus sonhos. Captada a informação musical, ela que vem do fora-do-sonho e poderia me alertar da minha condição de sonhante, foi transformada, ela também, em sonho pela sagaciadade da inconsciência.
Para minha alegria atual restam duas informações. Foi a própria estridência do som dos jovens sertanejos que, passado muito tempo, me despertou do sonho. Se chamei o sonho de porre logo acima, poderia dizer que aquela música foi como banho gelado e café amargo, me fez recobrar a consciência presente. Ao acordar com a música venci a estratégia do sonho de me tornar indiferente ao externo. A segunda informação obtive através do espelho após acordar. Vi um lado de minha face tomado de sulcos e um rubor que provavelmente foram causados pela intolerância do meu travesseiro. É um dado concreto que me faz piamente crer no fora-do-sonho. Minha face no espelho é prova de que o corte narrativo que sofri à pouco, marcou a passagem de um mundo idílico para o mundo em que estou agora.
Confiando nesta visão do espelho e agarrado à ela escrevo essas parcas linhas.
M.U.C.C.
3 comentários:
Essa sua aversão ao chamado sertanejo universitário é o que lhe faz mal. Se você não fosse tão enojado dele, se não punjasse esse ódio todo contra ele, talvez não acordasse qual como uma febre terça após um sonho. Tente ser mais flexível e entender que há outros gostos(mesmo sendo tão desgostos a seu paladar). Isso te fará bem.
Ps: É seu segundo texto que me vem à mente a obra do Salvador Dali, A persistência da memória.
você anda usando palavras muito fortes, eu não tenho aversão ao sertanejo universitário! eu até chamei esta expressão sonora de música no texto!
Correções: terçã e desgostosos. De resto está tudo certo. E tenho dito. hahahahha
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