quarta-feira, 9 de março de 2011

Os grandes e os pequenos.

Se eu tivesse alguma vergonha na cara desativava este blog de uma vez por todas. Não sei escrever, isso não é show de autoflagelação artística, e chego quase a me sentir mal de ocupar seu tempo improvável leitor. Cometo erros ortográfricos, minha pontuação muitas vezes deixa muito a desejar, me atrapalho com ênclises e mesóclises e o diabo. Sem falar em aspéctos mais profundos como estilo, ritmo e fluência. Sou metido a tocar violão também, pois nesse carnaval tive a oportunidade de ver o grande João Alexandre tocando e saí do espetáculo com o dever de nunca mais encostar a mão no meu violão. Dever esse já devidamente desobedecido é claro.

Há muita beleza e talento no mundo, tenho a impressão de que já há arte suficiente para todos. Não precisamos de novos escritores, leiamos Ésquilo, Cícero, Virgílio, Rabelais, Machado de Assis, Dostoievsky, literatura americana, latino-americana, russa, escandinava, tcheca. Deveríamos ouvir décadas de Villa-lobos, Debussy, Bach até nos darmos ao direito de quem sabe cometer a pachora de escutar um disco de Rock'n Roll. Não deveríamos ter novas ideias, usemos a dos antigos filósofos, não há de faltar conceito, reflexão, neologismos e tal. Deveríamos decretar por pelo menos dez anos um recesso artístico mundial, descobriríamos um oceano de novidades hakeadas de museus, arquivos, antiquários e mercados de pulgas.

Nem sempre se tem algo relevante entre as novidades, vou além é mais provável que não tenha. Fico admirado com as locadoras de filmes, cobram mais caro pelos filmes mais novos. A mim não faz o menor sentido. Todos os filmes antigos passam por uma seleção quase darwiniana exercida pela crítica, pela popularidade e pelo próprio tempo. É óbvio que entre os filmes antigos só restam nas prateleiras os verdadeiramente relevantes, entretanto entre as novidades encontra-se todo o tipo de lançamento. Não precisa ser um gênio para perceber que é muito maior a chance de se encontrar um filme bom entre os mais velhos do que ente os lançamentos. Os melhores são mais baratos e os piores mais caros, não dá pra entender! Talvez seja por isso que as locadoras estão falindo, apostaram sempre em um público ansioso por novidades que agora as estão trocando pelos piratas que são mais ágeis e baratos.

Esse apego histérico pela novidade só tem servido para produzir seres cada vez mais imbecis. O impacto inicial das coisas nem sempre se mantém depois da seleção do tempo. Me lembro de sair da sala do saudoso  Cine Vila Rica (aqui em Londrina) achando o Titanic o melhor filme de todos os tempos, tenho vergonha de ter pensado isso. O tempo mostrou o quanto esse filme não mereceu tantos oscars. Avatar eu já nem assisti para não correr o risco de cometer o mesmo erro. Não se pode produzir uma obra-prima por semana ou por mês, esse talvez seja o grande mal da chamada Indústria Cultural. Sempre tem de haver um novo Michael Jackson, uma nova Madona, um novo Cazuza e assim por diante. Os Histéricos pela novidade acabam vivendo do impacto e do estrondo de produções cada vez mais vazias. Ficam culturalmente mais infantilizados, vão lentamente virando ineptos para a sensibilidade da arte e da vida.

Vou continuar escrevendo aqui. Escreverei até como uma forma de combate a esse bando de ignorantes-pretensiosos que acham-se a cereja do bolo e arrogam-se a títulos e posições imerecidas. Eu posso estar posando de ranzinza, mas me escandaliza ver como tem gente que se acha apto, pronto, certo e assim ao infinito. Me orgulho de ter consciência da minha insignificância e mediocridade (é o clássico "me orgulho da minha humildade"), sei que de tudo que fiz e produzi até hoje quase tudo é pueril, banal e sem a menor relevância a não ser pra mim mesmo. Os elogios quando aparecem são ótimos, adoro recebê-los, é delicioso evidentemente, mas não me convencem facilmente. Sou uma fraude e quase todo mundo é também.

Devo continuar escrevendo, mas sempre evocando os grandes e verdadeiros merecedores de atenção, em um disciplinado exercício de autoapequenamento, escrevo para ver mais claramente meus limites. Devemos sobretudo nos ocupar em conhecer os grandes escritores, músicos e todos os outros artístas, como uma vez ouvi Antônio Abujamra dizer em uma palestra, não dá para ler tudo, leia os clássicos. Na arte desses gigantes vê-se refletida a sombra de toda a humanidade, pois como dizia Pessoa ou Borges (não lembro): "o homem é maior que o cidadão, não há estado que valha Shakespeare"

M.U.C.C.

Um comentário:

Anônimo disse...

Mas, ao mesmo tempo que entre os novos há muitas coisas ruins, há as novidades que sobreviverão ao tempo. Nunca se sabe qual será essa novidade vencedora... O que há é ler de tudo um pouco, assistir de tudo um pouco, ouvir de tudo um pouco, contanto que não nos entreguemos a idolatrismos vazios.
Parabéns pelo texto, professor! Aliás, por todos os textos. Não deixe de escrever, seu blog é um dos melhores que conheço :)